sábado, 16 de abril de 2011


Vou lhe contar uma história, preste bem atenção...

Em uma bela manhã de sol, numa terra distante, há décadas atrás, uma linda garotinha nasceu. Seis letras, um doce nome: C l a i r e. Ah, que doce criança! Tão bela, tão encantadora, tão adorável. Tão... Apenas tão. Uma em um milhão. Ela possuía a áurea azul, a alma clara, tão clara quanto seu nome significava ser. Ela não era apenas uma criança... Ela tinha uma alma diferente, a alma de uma borboleta. A borboleta azul. Imagine uma garota livre em meio a toda aquela ditadura, em meio a toda aquela humanidade preconceituosa? Liberdade demais era um crime tão grave assim? Ah, ela chorou. Chorou por ver como a humanidade se destruía mais e mais a cada dia que passava... Chorou por ver que ninguém era mais o que ela imaginava. Sentada encostado em um tronco qualquer de uma das árvores, sobre a relva que farfalhava de baixo de seus pés, com os olhos fechados e a mente distante. Imaginou-se em um barquinho qualquer, bem longe dali, explorando as limpas e cristalinas águas da lagoa vizinha. O lugar cercado por flores azuis e brancas, suas cores prediletas. Imaginou o quão belo aquilo seria. Alguém a chamou e ela respondeu. Era aquele garoto. O garoto do olhar curioso. [...] Cinco letras, uma idade: T r e z e. Tão nova, mas ao mesmo tempo tão sabia. Diziam que sabedoria só vinha com a idade, mas talvez estivessem errados. Talvez a sabedoria nascesse com cada um de nós, e alguns só demorassem pra descobrir. E ela descobriu tão cedo, até mais cedo do que sua mãe imaginou. [...] Perdida em seus pensamentos, ficou tanto tempo ali sentada com os olhos fechados que quase acreditou estar na lagoa da vizinhança, cercada por flores e borboletas. Embora soubesse que só bastava abri-los e tudo voltaria a ser a dura e pura realidade de sempre. Flores azuis e brancas estavam elevadas sobre a sua cabeça, quando abriu os olhos, surpreendeu-se. Era mesmo real? Estava mesmo ali? Seu país das maravilhas seria real...? Ou era apenas um sonho? Procurou pelo garoto do olhar curioso e nada achou. Procurou por aquela jaqueta, pelo tênis coloridos e até mesmo pelo jeans rasgado... E nenhum sinal dele, só de... Oito letras, uma maldita cor: V e r m e l h o. Sangue...? Meu deus, o que acontecera ali? Estaria o garoto do olhar curioso machucado? Garoto do olhar curioso, volte para mim! Ela quis berrar, mas sua voz parecia não sair. Apenas segurou as lagrimas, levantou-se e foi procurar pelo garoto. Seguiu por cima da lagoa, passando pela ponte e seguindo as gotículas vermelhas, até que achou o que mais temia... Logo lá, onde as borboletas viviam, onde a paz e a tranqüilidade jaziam. Ele estava deitado, de baixo das arvores, com uma rosa azul ao lado de seu corpo, sorrindo. Como ele pode sorrir até em um momento como esse? Aquele garoto de olhar curioso, estranho e maluco seria tão incrivelmente forte como parecia...? Uma linda borboleta azul e branca apareceu na frente da garota e ela seguiu, indo até o corpo do seu amado estranho que jazia ali. Cinco letras e um corpo jazia ali, vazio e sem alma: M o r t e. Seria ela tão ruim quanto parecia? Porque tanto a pequena Claire queria chorar por um desconhecido qualquer? Quatro letras, um sentimento: A m o r. Sofrendo, com as lagrimas descendo por sua face, percebeu que havia algo de diferente ali. Então, surpresa, viu seu amado acordar após a borboleta ter pousado sobre seu peito. A pequena borboleta azul e branca havia salvado uma vida, ou melhor, duas pra dizer a verdade. Afinal, ele agora era a vida dela e ela a dele. Duas vidas, um sentimento forte e um laço tão forte quanto. Logo depois dele ter se levantado, a borboleta caiu. A pequena Claire pegou-a com as mãos e sorriu. Como aquele ser tão pequenino podia ser tão especial? E porque ela parecia reconhecê-la? Então ela se lembrou... Um dia, minha filha, voltarei para você. Lembre-se: Como uma linda borboleta, mas voltarei para você. Mãe? Pensou ela incerta e por impulso, deu um beijinho sobre a borboleta, que jazia morta em suas mãos. Porque só um dia? Porque não um mês? Porque não anos...? Droga, droga, droga! Ela sentia falta, mas já não importava. Era a lei da vida, tinha de aceitar isso. Com cuidado, colocou o corpo da borboleta sobre uma das flores azuis e sorriu para o seu estranho. Então era real... Aquela história que sua mãe sempre lhe contara. As pessoas boas quando morrem, antes de irem para o céu, passam alguns meses pela metarmofose... Era assim que ela chamava aquele processo tão estranho e complicado, aquela fase da vida estranha que até hoje a pequenina não entendia muito bem. Para que um dia, enfim, possa ter um único e importante dia. O dia de salvar alguém que ela ame. Era o que sua mãe sempre lhe dizia e agora sabia o quão verdadeiro era. Ele podia estar morto. Ou ela. Mas não, estavam vivos. Aquela borboleta estivera ali para salvar a vida dos dois, que agora eram uma única vida e compartilhavam um único sentimento. A sua mãe a salvara. Mãe... De repente, enquanto perdia-se em pensamentos, sentiu alguém atrás de si. Virou-se rapidamente e lá estava ele... O garoto do olhar curioso. E foi naquele dia que o amor nasceu, o primeiro amor de Claire. O amor em que passou o resto da vida ao seu lado, até a própria morte. Cuidou de sua filha e quando a mesma cresceu, morreu. E logo depois, Claire morreu também. Sua filha, Clarisse, continuou viva e passando a história por gerações. E a cada geração de cada família, aquela história sempre se repetia, de formas diferentes, mas sempre se repetia. No dia de sua morte, Claire falou com sua filha: Lembre-se: Como uma borboleta, mas eu voltarei para você. E ela voltou, como havia prometido.

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